Reflexões sobre corpo e mente

outubro 18, 2017

Porque Edith Head foi a maior figurinista de Hollywood.



Falar sobre mente e corpo para mim é algo difícil, especialmente porque sempre fui uma mulher muito sedentária, sem muita consciência do que acontecia com o próprio corpo. Acho que essa alienação é proposital, não? Se você não reflete, é mais fácil engolir qualquer coisa que te digam.

No entanto, neste ano, eu não sei o que aconteceu, mas a verdade é que estou passando por muitas mudanças na maneira como enxergo o mundo e como me vejo nele. Tudo começou com o pilates, o saudoso pilates. No começo de 2017, eu andava com muitas dores pelo corpo, fruto das horas que passo sentada traduzindo. Como disse no último post, o filme da minha vida poderia se chamar A mulher que não sabia a hora de parar. É claro que meu corpo seria o primeiro a sentir os efeitos disso. Eu não liguei para suas mensagens até ter uma dor crônica na perna, que me incomodava a qualquer movimento que eu fazia. Uma amiga recomendou que eu fizesse pilates, pois meu corpo se fortaleceria e eu me recuperaria dessa dor tenebrosa.

Estava ansiosa pelo pilates por motivos de socialização. Já tinha feito academia no passado, uma experiência tenebrosa para dizer o mínimo. Meu medo de falar com outras pessoas era tamanho que, um dia a esteira começou a correr na velocidade cinco do créu e eu fiquei sofrendo longos minutos até conseguir pedir ajuda a alguém para desligá-la. Que lição tiramos disso? Melhor morrer do que falar com pessoas.




A aula experimental de pilates foi fantástica, embora meus músculos não tenham achado o mesmo. Gostei muito dos exercícios. Foi ali que comecei a pensar mais no binômio corpo e mente. Precisava relaxar a minha mente para meu corpo fazer os exercícios. Precisava respirar corretamente e focar minha mente naquele momento. Foi um caos. Porque eu sou ansiosa. Minha cabeça está sempre a milhão em todos os momentos, como aquelas locomotivas de trem bem doidonas. Fazer força para esvaziar a mente era mais difícil do que movimentar meus músculos. Um dia, meu professor pediu para eu apoiar meus braços nas barras da cadeira, instrumento de pilates, e projetar meu corpo para cima (numa espécie de flexão em pé) usando a força deles. Apesar da dificuldade e do cansaço que o exercício me causou, consegui não pensar em nada naquele momento. Foi épico.

Depois comecei a correr e a fazer pilates. Quando eu ia imaginar isso, logo eu a pessoa menos fitness da paróquia? Jamais. Infelizmente, parei de fazer os dois, mas o que levei disso foi o seguinte: o exercício não serve só para ficarmos bonitas, projeto verão e afins. Não, o exercício coloca você em outra dimensão, em contato com seus limites, faz você desafiá-los o tempo inteiro. Então por que você parou? Porque a vida aconteceu, a mulher que não sabia a hora de parar o trabalho tomou conta de mim e agora vivo tentando enxotá-la da minha vida. 

O coletor menstrual também foi algo que chegou em minha vida por acaso e, junto com o exercício físico, me fez repensar a relação com meu corpo. Há muito tempo eu queria experimentá-lo, mas, na época, era muito caro. Antes de usá-lo, assisti a muitos vídeos explicando os cuidados, a maneira de inseri-lo corretamente, onde ele ia e tudo o mais. Moral da história: não sabia nada sobre meu corpo. Colo do útero? O que é isso? Tem tamanho? Eu me sinto muito envergonhada em admitir que não sabia nada, mas é como eu disse lá em cima, a alienação é um instrumento que nos impede de tomar decisões, estar consciente e podermos escolher o que é melhor para nós. No meu caso, o absorvente foi algo decidido pelos outros, não por mim. Era o que havia na prateleira do supermercado, era o ~mais simples. Porém, durante a menstruação, o absorvente só me fazia sofrer. Me incomodava, vazava e eu odiava tudo aquilo, odiava meu corpo, odiava o cheiro, odiava tudo. Odiava ter que usar duas calcinhas para dormir e acordar no Mar Vermelho. 

Ao inserir o coletor menstrual pela primeira vez, eu estava mais segura do que em 15 anos usando absorvente. Incomodou-me bastante nos primeiros dias, mas depois já não sentia que estava com algo. Parecia que eu nem estava menstruando. O melhor é que essa feitiçaria (ou melhor, tecnologia) foi inventada no começo do século, por uma mulher. Por que ela só se tornou realmente acessível agora? Aí entramos no assunto capitalismo, um dos motivos que me faz adorar o coletor menstrual com todo meu coração. É interessante para a indústria que você viva comprando absorventes, descartando-os no meio ambiente. Qual é o interesse em comprar algo que dura dez anos, logo não necessita de descarte imediato? Pois é. Para mim, foi a melhor escolha da vida.

Se estamos falando sobre corpo e mente, é claro que temos de falar em comida. Comer é um ato social, guiado por escolhas nada aleatórias. Isso por si só já é bem doido de pensar. Há muito tempo pensava em me tornar vegetariana, mas só consegui dar o grande passo há dois meses. Nunca gostei de comer carne, e as pessoas acham isso muito engraçado, porque eu moro na terra do churrasco. Como não gosto? Meus filhos, vocês já ouviram falar em pão com alho? E salada de batata? Isso é que é coisa boa mesmo! Sempre me empanturrei dessas coisas durante o churrasco, nunca sobrava espaço para a carne. Então, de certa forma, meu caminho estava meio andado, uma vez que eu passava longos períodos sem carne, sem sentir muita falta.

É engraçado pensar que tomei a decisão de começar a transição para o vegetarianismo em um dia no qual comecei a questionar todas as escolhas da minha vida. Quanto a comer carne, me dei conta de que eu fazia isso porque os outros estavam a me vigiar. Vivi boa parte da minha vida com minha avó, e ela era uma das pessoas que mais realizava a fiscalização do meu prato. Você vai comer só isso? Não, vai comer isso daqui também. Eu era violentada o tempo inteiro, violentada de um jeito tão forte que, um dia, comecei a chorar por causa de comida. Porque simplesmente não podia pegar meu prato e comer o que eu quisesse. Cadê a minha autonomia? Vigiar e punir, punir as mulheres por suas escolhas, é isto. Por isso, assim que tomei a decisão de começar a transição, pensei na dificuldade que teria em me impor para resto da minha família. Para minha surpresa, foi justamente o contrário. Eles aceitaram de uma forma tão surpreendente, é um mistério para mim até hoje.

Muitas pessoas contam como a transição mudou a vida delas e isso é muito verdade. A minha vida está em constante mudança desde o dia em que parei de comer carne. A primeira delas é que eu estou indo mais para a cozinha, me permitindo acertar e errar. Não fico tão triste se erro, porque isso faz parte do nosso aprendizado. Nunca tive pais que cozinhassem, então não tenho parâmetro algum na cozinha. É tudo mais complicado, mas eu gosto. Por aqui, temos o costume de assar o churrasco, uma grande reunião familiar. Eu decidi fazer um churrasco vegano. Cozinhei pela primeira vez a proteína de soja e, apesar de ela ter ficado salgada demais, o meu churrasco foi um sucesso. Os legumes em espetinhos ficaram tão gostosos depois de assados, Meu Deus!

Algumas coisas que fiz e deram certo:

1) Biscoitos de banana e aveia: esta é receita é tão fácil, prática e maravilhosa que eu ainda quero fazê-la muitas vezes. Você vai precisar de menos de dez ingredientes, uma boa mão para misturá-los e um forno. Deu. Eles ficam gostosos, macios e rendem até 20 biscoitos.

2) Churrasco vegano: esta receitinha é maravilhosa, só não carregue no tempero como eu. Basta cozinhar os legumes, mariná-los no molho. A mesma coisa com a proteína de soja. A ideia é deixá-los uma noite inteira marinando para eles pegarem o gosto. Fica uma delícia e rende muitos espetinhos!

3) Salgado de hambúrguer: esta é uma das minhas favoritas. O mais trabalhoso talvez seja sovar a massa, mas depois que você faz isso, frita o bife de soja e o ajeita dentro da massa, é sucesso garantido. Fica muito gostoso.

Ainda tenho planos de me tornar vegana, mas acredito que preciso de tempo para dar mais esse passo. Não quero me apressar, acho que cada um sabe a hora em que está pronto. Ainda não chegou a minha, só isso. De qualquer maneira, depois de ter tomado consciência de todos os abusos que os animais sofrem para que as coisas cheguem à nossa mesa, eu tenho certeza de que não irei querer colocar carne na boca. Isso, é claro, não faz com que eu não sinta vontade. De vez em quando, o cheiro ainda me faz salivar, mas não é algo incontrolável. Não vou negar, às vezes eu passo em frente ao McDonald's e o cheiro me deixa hipnotizada, exatamente como vemos nos desenhos. Porém, eu tento lembrar os motivos pelos quais parei de comer carne e isso é mais forte do que qualquer desejo que eu possa ter.

Mudando de saco para mala: sobre roupas


Já que estamos falando sobre corpo e mente, eu tinha de comentar sobre o fato de o meu estilo de me vestir estar cada vez mais parecido com o da Nathalia Timberg. Juro para vocês que não é intencional, não posso fazer nada se nós gostamos de usar as mesmas coisas. Meu armário está cheio de camisas, blazers e calças, e eu não poderia estar mais contente com isso, especialmente porque essas peças vieram de brechó.

Meu sonho sempre foi me vestir com roupas de brechó, elas sempre foram muito próximas ao que eu gosto de vestir, ou seja, roupas mais vintage. No entanto, a preguiça sempre me fazia comprar em lojas de departamento. Nunca saía delas satisfeita, era sempre um tormento encontrar uma calça que não sobrasse nas minhas pernas, sempre um tormento encontrar roupas adultas que servissem no meu corpo, que por ser pequeno e mignon fica um pouco restrito. Além disso, o estilo das roupas dessas lojas nunca me agradou.

Recentemente, minha madrasta se desfez de muitas roupas e me deu algumas. Camisas fabulosas, estampas lindas. Eu falei tão mal do meu pai por usar camisas coloridas, mas cá estou repetindo o que ele fez há 26 anos. Acho que, ao ver essas roupas tão bacanas e que tinham tanto a ver comigo, a minha vontade de não desistir do guarda-roupa dos meus sonhos voltou. Eu ainda teria as peças que via minhas estrelas usando.

Algumas peças de que minha madrasta se fez.


Pois bem, agora eu tenho um macacão que, segundo uma amiga, me faz parecer uma pantera. Quando eu o experimentei, pensei É ISSO, É ASSIM QUE EU QUERO ESTAR NO MUNDO. É tão bacana quando encontramos roupas que nos representam. Sempre adorei coisas mais retrôs, meu vestido de formatura foi inspirado no figurino de Catherine Deneuve em Oito mulheres. Poder trazer essas peças para meu guarda-roupa me deixa extremamente emocionada.


Você quer, Farrah Fawcett?


O que me ajudou muito a tomar essa decisão foram os vídeos da Nátaly Nery, uma YouTuber maravilhosa que tem um canal fantástico, o Afros e afins. Lá, vocês encontram, além de vídeos fantásticos sobre feminismo negro, muito material sobre brechós e garimpagem. Outra pessoa que me inspirou a criar coragem para ser eu mesma foi a Rafa, minha parceira de malandragem no Cine Suffragette e rainha de garimpar peças fabulosas. Seguir o Instagram dela pode te dar boas ideias de combinações, além de ela escrever bem para caramba.

E o que fica de tudo isso?


Coração e mente leves, como desde a minha adolescência eu não me sentia. Sinto que estou sendo eu mesma, fiel à minha personalidade, sabe? Dá um medo tremendo, mas nada compensa a sensação de paz de espírito. De não sentir (tão) levada pela corrente.

Afinal, como diria o Walter Franco:

É tudo uma questão de manter
A mente quieta
A espinha ereta
E o coração tranquilo

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1 comentários

  1. Acredito que todas esses mudanças fazem parte de um processo de amadurecimento, de nos tornamos o que sempre desejamos ser, mas que, talvez, só com o tempo poderíamos estar prontas para nos tornamos – e aos poucos.

    Fiquei contente em saber que se tornou vegetariana, é um processo fantástico que desencadeia muitas outras boas mudanças. Achei bacana você ter comentado sobre o 'momento McDonald's' e o que posso compartilhar da minha experiência vegan com você é: pensar no que nos motiva é mesmo essencial pra se manter forte. ♥

    Você está linda no estilo As Panteras! hahaha
    Estilo vintage é só amor e, sem dúvidas, brechós são os melhores lugares para compras. Estou apaixonada por aquele casaquinho amarelo da sua madrasta que aparece na foto, que lindeza. ♥

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